Imagine se toda manhã,
antes de ir para o trabalho, você tomasse um comprimido que, além de te deixar
mais ligado e concentrado, melhora a memória e impulsiona a criatividade e a
produtividade.
É isso que cada vez
mais pessoas estão fazendo em lugares como o Vale do Silício – região do norte
da Califórnia, nos EUA, considerada a capital mundial da indústria da
tecnologia –, onde os chamados nootrópicos vêm se popularizando nos últimos
anos.
Essas substâncias –
cujo nome vem do grego "nóos" (mente ) e "tropo" (direção)
– supostamente são capazes de ajudar a melhorar o desempenho mental sem
produzir efeitos colaterais negativos.
Apesar do ceticismo
da comunidade científica quanto a sua eficácia, esses "potencializadores
cognitivos" são cada vez mais usados em ambientes de trabalho
competitivos, nos quais o intelecto é muito mais importante do que qualquer
outra habilidade.
Sob o guarda-chuva
dos nootrópicos estão, por exemplo, compostos químicos da família dos racetams
(como o piracetam e o pramiracetam) e substâncias como vitaminas e aminoácidos
encontrados em alimentos e plantas que podem ser comprados em lojas de
suplementos e de produtos naturais.
Alguns são remédios
receitados para o tratamento de idosos que apresentam alterações em seus
mecanismos cognitivos e que sofrem de males como a demência e o Alzheimer.
Seus defensores
asseguram que essas substâncias ajudam, por exemplo, a melhorar a memória, a
capacidade de aprendizagem e a concentração.
Medicamentos como o
Adderall, prescrito para tratar transtornos como hiperatividade e narcolepsia,
também são utilizados por estudantes que querem melhorar o desempenho
cognitivo, apesar do risco de efeitos colaterais como arritmia e ansiedade.
Popularidade
Nos anos 70, o
pesquisador romeno Corneliu E. Giurgea definiu como nootrópicos as substâncias
que, apesar de potencializar as capacidades cognitivas, não são tóxicas,
viciantes ou provocam efeitos colaterais significativos.
Não há um consenso
sobre como funcionam muitas dessas substâncias, embora quem as utilize acredite
que elas melhoram o metabolismo cerebral.
Embora
não haja dados oficiais, seu uso tem crescido nos últimos anos em países como
os Estados Unidos. Na internet, proliferaram blogs e fóruns de discussão que
debatem que nootrópicos consumir, e em que quantidade.
Com o
incremento da demanda, houve um boom de empresas que vendem pílulas com
diversas substâncias consideradas nootrópicas, como cafeína e ômega 3.
Entre
essas companhias, estão a Nootroo e a Nootrobox, startups do Vale do Silício
que asseguram ter entre seus investidores importantes nomes da indústria da
tecnologia.
Elas
afirmam que os efeitos dos nootrópicos dependem da quantidade consumida e do metabolismo
do usuário, e que não há estudos que tenham determinado os efeitos a longo
prazo.
'Úteis'
Jesse
Lawler, programador que vive em Los Angeles, começou a se interessar por
nootrópicos e outras drogas inteligentes há alguns anos.
"Percebi
que poderiam ser úteis para as tarefas mentais que tinha de fazer no
trabalho", explicou Lawler, que produz e apresenta o podcast Smart
Drug Smarts.
"No
meu caso, têm se mostrado úteis para, por exemplo, ampliar os períodos de
concentração. Uso como ferramentas para melhorar meu estado mental",
afirmou Lawler à BBC.
O
programador disse que, embora "em nossa sociedade a palavra droga tenha
conotação negativa", as que ele consome "têm efeitos fisiológicos
benéficos."
"Além disso, procuro seguir uma dieta
equilibrada e fazer exercício. Nunca tomaria nada que poderia ter um efeito
negativo sobre meu corpo e, principalmente, sobre meu cérebro", assegurou
Lawler.
Segundo ele, os nootrópicos são especialmente
populares entre os trabalhadores do Vale do Silício e de Wall Street, meca do
mercado financeiro em Nova York.
"Existe uma ideia de que, se você usa
drogas inteligentes para potencializar sua inteligência, está trapaceando...
Mas não acredito haver algo de mal em querer que seu cérebro funcione
melhor."
Lawler reconhece que há entre os usuários dos
nootrópicos uma "confusão sobre que substâncias usar e como
tomá-las", e que há muita gente que está se aproveitando disso para ganhar
dinheiro.
"Se você está pensando em comprar pela
internet, tenha cuidado", adverte.
'É melhor fazer
exercício'
Lucien Thomson, professor de neurociência da
Universidade do Texas em Dallas, põe em dúvida a eficácia de muitos dos
nootrópicos. "Os estudos já realizados não são conclusivos", afirmou
à BBC.
"Muitos dos sistemas neurotransmissores
que conhecemos e que e estão ligados à memória também participam de outros
processos. Se você tomar algo para melhorar a memória, estará afetando também
outras funções cerebrais, com efeitos imprevisíveis", continuou.
"Além disso, não é possível controlar as quantidades dessas substâncias que as pessoas andam tomando. Sem uma supervisão adequada e considerar os possíveis efeitos colaterais, as consequências podem ser perigosas", disse o especialista.
Segundo
ele, a melhor estratégia para melhorar as funções cognitivas é manter uma boa
saúde.
"Sabemos
que a atividade cerebral melhora com o exercício. As pessoas levam um estilo de
vida sedentário e querem resolver isso com uma pílula, o que é absurdo",
afirmou.
Para o
especialista, é preciso ainda estimular a mente. "Fazendo palavras
cruzadas, por exemplo, e mantendo uma vida social. E não me refiro às redes
sociais, mas sim conversar com outras pessoas. Tudo isso traz benefícios à
memória."
Thomson
não nega que alguns remédios possam trazer benefícios para a memória, mas
ressalta que, nos estudos já realizados, a maioria do que é vendido como
nootrópico não levou a efeitos positivos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário